quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Minha pequena

Há dois e meio anos, minha vida mudou completamente. Não, não foram as drogas, ou a bebida ou a morte de um ente querido. Foi o surgimento de uma irmã.
Sim, é possível que depois de quase quinze anos meus pais cometessem a loucura de ter outro filho e eles sabiam o quanto seria difícil me contar a novidade.
Eu sempre fui daquelas filhas únicas que nunca quis um irmão - nem meio. Lembro que quando me perguntavam se tinha irmãos, eu sempre dizia com um imenso sorriso no rosto: "Não, graças a Deus" - e acreditem, muitas vezes até levantava as mãos para o céu. Além disso, sou bastante ciumenta e sabia que jamais conseguiria dividir minhas coisas. E para completar o pacote, eu nunca, nunca, nunca gostei de crianças - nem quando eu era uma criança. Então, imaginem só como foi a minha reação ao descobrir que minha mãe estava grávida.
Se me lembro bem, meu pai teve a boa vontade de ir me preparando fazendo algumas brincadeirinhas, mas não funcionou, porque eu realmente achava bastante improvável que minha mãe tivesse outro filho com quarenta anos de idade.
Mas teve.
E tudo ocorreu como eu esperava que fosse: meus pais me contaram e eu senti uma raiva tão grande que não se compara a nenhuma outra que tenha sentido até hoje; eu chorei a noite inteira de ódio; minha família ficou com medo que eu fugisse de casa e me mandou uma cesta de café da manhã; eu comecei a sentir ciúmes já na gravidez e claro, isso só piorou com o tempo.
Passados os nove meses, aquele ser humano em miniatura com cara de joelho chegou. Eu chorei no parto e chorei quando peguei a pequena Sarah pela primeira vez no colo - e não foi um choro de raiva dessa vez.
Desses dois anos e meio pra cá, aprendi a amar minha irmã, mas não aprendi a lidar com ela. Pior que isso, não aprendi a lidar com a minha vida depois da chegada dela.
Uma criança muda toda a rotina, todos os costumes e todas as conversas do encontro familiar de domingo. E isso cansa.
Querem saber? Se me perguntam eu tenho honestidade suficiente para dizer que sim, eu preferia quando não havia a pequena Sarah. Mas devo admitir que quando aquela pequenininha sorri pra mim, me abraça, me dá um beijinho na bochecha e chama meu nome, eu sinto uma paz imensa.
Quem sabe um dia eu aprenda a lidar com os quase 15 anos que nos separam. Por enquanto, continuarei sendo a irmã ciumenta que só brinca quando os pais não estão em casa.

domingo, 17 de janeiro de 2010

Perigo: sonho

Sonhos são realmente perigosos.
A ideia de que você não tem o controle daquilo que deseja, que pensa e que sente pode se tornar perturbador, afinal, do que adianta controlar os impulsos e os desejos ocultos durante o dia se à noite todos eles aparecem sem que possamos fugir deles ou negá-los?

Isso atormenta, isso apavora e no meu caso, vem como um cutucão dizendo em alto e bom som: "Ei, você não manda nada!" - foi assim que me senti quando acordei às uma da tarde de hoje, com meu pai abrindo a porta e puxando meu cobertor.
Eu abri os olhos e infelizmente me lembrei do sonho, de tudo, inclusive de algumas malditas sensações. Por que os sonhos parecem tão reais às vezes?
Meus sonhos muitas vezes me fazem lembrar dos rostos, das vozes, dos cheiros e dos gostos que eu demorei meses, anos para esquecer. Tudo volta em algumas horas de sono agitado.
Fiquei mais uma meia hora na cama lembrando e questionando se eu realmente não tenho o controle. Será mesmo que nós, seres humanos, não podemos nunca manter certas vontades sempre ocultas? Mesmo quando elas são erradas, desnecessárias e até mesmo irritantes? Por que nossos sonhos insistem em nos mostrar aquilo que fazemos questão de esquecer?
Talvez seja um sinal de que não é hora de arquivar certas lembranças ou então é simplesmente uma peça que a nossa mente prega na gente.
O que importa é que levantei da cama e decidi que enquanto estiver acordada eu manterei o controle da mente, do corpo e, se possível, da alma.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Piloto automático

O tempo está passando rápido demais.
É possível lembrar como se fosse ontem, quando as férias pareciam longas demais, quando a madrugada passava devagar, quando a parte da tarde era o tempo mais que necessário para correr, brincar, estudar e ainda ver um pouco de TV.
Por que o tempo parece correr mais agora? O que de fato mudou nas nossas vidas?
O dia continua com 24h, as horas continuam com 60 minutos... então, por que nos perdemos tanto no tempo ultimamente? As horas parecem correr da gente.
Acordo às 10, tomo café, arrumo o quarto e quando olho já são duas da tarde.
Será por isso que as pessoas não param mais para nos responder a localização das ruas, o horário, ou simplesmente para nos dar um sorriso ou pedir licença?
Não que eu esteja fora do time dos “focados”, dos que não mudam a rotina nem para ajudar uma senhora com as compras, mas me pergunto até onde iremos nos tornando escravos do tempo.
A busca pelo o que é mais prático virou regra. Não nos entregamos a nada nem a ninguém para evitar uma possível perda de tempo futura; não andamos mais a pé, não agradecemos ao atendente da loja, não paramos nem ao menos para assentar e almoçar.
Há pressa para tudo: amar, ganhar, perder, ir, voltar, comer, ouvir, falar, escovar os dentes, lavar as mãos, dormir, acordar, pensar, agir, casar, separar, cozinhar, escrever e até mesmo relaxar.
E nisso perdemos as boas risadas, os bons amigos, as boas experiências, as boas oportunidades... perdemos o sentido real da palavra “viver”, que passa a significar somente nos manter vivos fisicamente, sem desejos, sem sonhos, sem vontades e só com obrigações e tarefas que passamos a exercer como robôs.
Perdemos a paixão, perdemos o frio na barriga, perdemos a vontade de tentar; ganhamos o comodismo, a praticidade e a segurança de que quando não há tentativa, não há também erro.
O que nos dá esperança é ver que ainda há aqueles que se recusam a acompanhar o ritmo geral e criam um ritmo pessoal.
Devemos às vezes jogar fora as armas da razão, correr o risco de errar e talvez sorrir um pouco mais e até mesmo chorar um pouco mais. Temos que nos empenhar em voltar a ser mais humanos.